Cidades debaixo d’água, casas arrastadas pelas enxurradas, cemitério de carros, pontes levadas pela água, plantações ressecadas. Os desastres naturais provocados por fatores como chuva ou seca em excesso deixam um rastro de destruição por onde passam com um custo bilionário não apenas para quem está vivendo a tragédia mas para o país de um modo geral.
Segundo o governo federal, o país perdeu R$ 485 bilhões nos últimos 11 anos. Os dados são do Atlas de Desastres, que é organizado pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional. O valor, que leva em conta os anos de 2012 a 2023, representa prejuízos públicos e privados com a destruição de escolas, hospitais, estradas, empresas e perdas agrícolas. Além dos danos materiais, que representam as perdas das pessoas, que precisam se reerguer do zero depois de tragédias como a de São Sebastião, em 2022.
O montante bilionário é resultado de dois fatores: O aumento no número de extremos anunciado por pesquisadores. Enquanto a chuva torrencial castiga o Sul, o Norte ainda tenta se recuperar da seca histórica de 2023, com impactos em todo o país. E a falta de resposta em uma política pública de prevenção e de preparo para as mudanças.
Na contramão do que recomendam os especialistas, o levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre investimento em prevenção de desastres mostra que o valor foi caindo ao longo dos últimos anos e representa uma pequena fatia diante dos prejuízos bilionários. Ou seja, o país investe mais para remediar, do que para prevenir.
O que os pesquisadores alertam é que o custo para prevenir o desastre teria sido bem menor do que o montante perdido se houvesse atenção às mudanças climáticas.
Perdas no RS
Em Porto Alegre, por exemplo, o montante necessário para modernizar o sistema contra enchentes, que falhou e não conseguiu conter a cheia do Guaíba, estava previsto em R$ 400 milhões.
Agora, a cidade está destruída e, embora ainda não haja uma estimativa do custo para a sua reconstrução, um relatório da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fergs) dá uma ideia do tamanho da perda: apenas a região metropolitana da capital, hoje debaixo d’água, era responsável por entregar R$ 107 bilhões em produção e não se sabe quando conseguirá se reerguer.
A Fecomércio-RS divulgou um relatório que indica que os prejuízos patrimoniais às pessoas atingidas em todo o Rio Grande do Sul pode passar de R$ 1,7 bilhão.
“A tragédia no Rio Grande do Sul é o evento mais caro que o país já teve. A cultura no Brasil é reativa, preferem gastar milhões em reconstrução quando poderiam gastar menos com prevenção, para que a recuperação fosse mais barata e mais fácil”, explica José Marengo, especialista em mudanças climáticas e pesquisador do Cemaden.
O número ainda não inclui a perda imensurável com as mortes nas tragédias. Ao longo de onze anos, mais de 2 mil pessoas morreram em desastres naturais. Além das pessoas que, feridas, tiveram a vida alterada e os animais que também morreram.
A pesquisadora Viviana Aguilar Munhoz, que estuda os impactos dos desastres, do Cemaden, os prejuízos depois de um desastre não afetam apenas a região da tragédia, mas o país e o bolso de todos, como um todo.
“No caso do Rio Grande do Sul, por exemplo, temos um problema com a produção de arroz, que se perdeu. O governo vai importar arroz para conter o impacto na inflação do alimento que está na mesa de todos os brasileiros. Então, todos nós perdemos quando um desastre acontece”, explica.
Principais falhas
A chuva de grandes proporções no Rio Grande do Sul é um fenômeno natural, mas previsto. A vulnerabilidade do Sul do país para extremos envolvendo chuva é do conhecimento do governo federal desde, pelo menos, 2016. Além disso, o governo gaúcho foi avisado antes sobre o risco.
Dias antes, o Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden) emitiu um alerta de chuva acima da média com consequências para as cidades do estado. O órgão é quem faz os alertas oficiais para a Defesa Civil.
Especialistas explicam que uma série de falhas impediu que as pessoas não fossem impactadas:
• Cidades tinham pouca ou nenhuma estrutura para a Defesa Civil;
• Ausência de um plano que indicasse às pessoas o que fazer e para onde ir com o alerta. Segundo o governo do Rio Grande do Sul, só 54% das cidades tinham uma estratégia.
• Falta de monitoramento para o risco de desastre. Apenas 45 estavam no sistema federal e ampliar dependeria de investimento;
• Falta de campanha para que as pessoas estivessem cadastradas no sistema que manda o alerta por telefone: apenas 11% da população gaúcha está inscrita.
• Falhas por falta de modernização no sistema de contenção de chuva, como é o caso de Porto Alegre.
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